domingo, 31 de janeiro de 2016

Ágora

O filme entrelaça a história da Filósofa Hypatia de Alexandria e o início do domínio cristão 400 anos depois de Cristo.

Existem dois aspectos interessantes nessa obra: a forte personagem feminina, filósofa, astrônoma e professora, que desperta a ira e o fanatismo cristão, tomando proporções inacreditáveis ao longo da obra.

Acostumados que somos a pensar sempre nos cristãos sendo devorados por leões no início do cristianismo, aqui eles se tornam os vilões. O fanatismo e a loucura tomam conta da cidade de Alexandria, onde os pagãos e judeus são, aos poucos, aniquilados.

É claro que a independência de uma mulher como Hypatia causa problemas com aqueles homens cristãos ignorantes. Embora nunca tenha se interessado por nenhum homem, ela é chamada de prostituta, além de bruxa, e acusada de ateísmo. 

Muito interessante ver os cristãos sob essa perspectiva. Sempre penso na ironia dos lugares de poder na História. Os judeus que assassinam os cristãos são as vítimas do nazismo. Os papeis se invertem nesse momento, onde judeus e pagãos são vítimas e os cristãos, algozes, enfim, é interessante observar essa dinâmica, que, ao menos para mim, traz a reflexão do quão impermanente são as posições que ocupamos. 




sábado, 30 de janeiro de 2016

Azul é a cor mais quente

O filme retrata um relacionamento entre duas mulheres, uma delas já consciente de sua sexualidade e de suas escolhas, a outra ainda descobrindo suas preferências. Há muita sensibilidade na retratação dessa relação. Mesmo as explícitas cenas de sexo trazem a urgência da força do feminino. Por outro lado, a abordagem está mais nos sentimentos e no cotidiano da relação, não levantando bandeiras sobre liberdade e homossexualismo. 

Ao longo do filme, o relacionamento vai evoluindo e mudando de estágio e, assim como em qualquer relação, se alteram as percepções e a dinâmica do casal. 

Interessante observar que os relacionamentos têm problemas muito semelhantes, sejam eles como forem, e não estou falando só de homossexualismo, mas de maturidade, questões culturais, e toda e qualquer diferença que se possa imaginar, ou seja, as semelhanças dos desafios que enfrentamos em nossas relações nos uniformizam em nossa essência humana e superam as características individuais. 

Também é interessante observar que pode haver pitadas de machismo em qualquer relação, seja nos xingamentos ou nas agressões que acontecem em uma discussão. 

A meu ver, um belo filme sobre pessoas comuns que vivem um amor verdadeiro, retratado com sensibilidade e arte. 

sábado, 16 de janeiro de 2016

Dançando no escuro

Não é possível ficar indiferente ao drama que Lars Von Trier nos traz com esta história. 
Uma vida simples e sem perspectiva é o que Selma (Björk) apresenta de maneira primorosa. Como sempre, Von Trier contrapõe a miséria humana, o egoísmo, o preconceito e a simplicidade, a humildade, a amizade e o amor. 
Selma trabalha numa fábrica juntando todo o dinheiro que recebe para pagar uma cirurgia para seu filho. Sua vida é humilde e difícil. Seus vizinhos a ajudam, assim como os companheiros da fábrica e o grupo de teatro do qual participa. 
Como se a realidade não fosse triste o suficiente, uma traição de uma pessoa de sua confiança muda seu destino. A injustiça da situação toda é desgastante. O sonho americano - se é que ainda existe esse conceito - vai por água abaixo com o desenrolar dos acontecimentos. 
O final é trágico, mas trágico naquele ponto em que você realmente fica achando a vida uma desgraça completa e o ser humano o pior erro de todos. Todos que assistem o filme comentam que choraram até desidratar e eu não sou exceção.
Excelente!

domingo, 10 de janeiro de 2016

Primavera, verão, outono, inverno...e primavera

O diretor faz um paralelo entre as estações do ano e as fases da vida do jovem aprendiz de monge. 
Experiências como a solidão, a religiosidade, a paixão, o ciúme, o desequilíbrio, o perdão e por fim a maturidade integram a vida do jovem monge. A simplicidade do cenário - uma cabana num lindo lago - é a contraposição da complexidade dos sentimentos que habitam o coração do personagem. 

A natureza é exaltada e os animais, sempre presentes, são símbolos da trajetória do jovem, assim como as estações do ano. A relação do homem com a natureza é um desafio ao monge ainda quando criança. A paciência e abnegação do mestre se fazem presente durante toda a narrativa. 

O filme desperta questionamentos em nossa própria existência. Mesmo que tão distante da nossa realidade, os questionamentos do aprendiz se mostram os mesmos de qualquer outro ser humano. A descoberta de cada experiência, da agitação da infância, à perturbação da juventude e, finalmente, o reencontro consigo mesmo, na maturidade. O que buscamos? Quem somos? Até que ponto a religiosidade que cultivamos ou não pode interferir no processo de auto-conhecimento? Todos, onde quer que estejamos, estamos sujeitos a esse processo de crescimento psicológico, e cada um de nós se submete a este ciclo de maneira única, dotados da solidão com que somos presenteados no nascimento e na morte. 

A espuma dos dias

Eis um filme interessante!

Sua história é simples, um casal se apaixona, mas ela contrai uma doença: uma flor começa a crescer em seu pulmão. Surreal é toda a atmosfera do filme, que conta com mil criaturas mecânicas vivas e muitos efeitos diferentes, como pernas e braços muito esticados, ou personagens nadando no ar de Paris. 

O grande mote do filme são as críticas a aspectos da sociedade atual, como o consumismo e o uso de remédios. 

Um dos aspectos que mais me chamou a atenção foi a inversão da importância da relação patrão/empregado, no filme o patrão se sente honrado pelo trabalho do empregado (Omar Sy), uma relação inexistente na realidade da história da humanidade ocidental (até o momento). 

O diretor cria um ambiente lúdico que critica os abusos da sociedade contemporânea. A doença de Chloe (Audrey Tautou) chama seu fútil marido Colin (Romain Duris) à realidade, fortalecendo os laços de amizade com os outros personagens da trama. O filme consegue ser surreal e profundamente verdadeiro, mas ainda assim, dotado de uma delicadesa comovente. 

A grande beleza

Não poderia começar o blog falando de outro filme. Assisti deliciada a essa obra prima, lembrando um pouco (só um pouco) do Fellini. A história se passa em torno de um personagem maravilhoso, Jap Gambardella, um escritor/jornalista que escreve sobre arte e conhece todas as grandes personalidades de Roma. A Cidade Eterna, aliás, também é protagonista e é lindamente mostrada na produção. 

O filme possui muitas ideias para análise. A primeira e principal é relação entre Jap e a idade e a falta de perspectiva que um homem bem sucedido enfrenta. Jep tem tudo: dinheiro, festas e lindas mulheres, mas parece faltar algo. Pensa constantemente em escrever seu segundo livro. 

Também se vê o vazio da alta sociedade, entregando-se a festas, ao álcool e drogas, as cenas das festas são incríveis, quase cômicas são as personagens patéticas que a compõe. 

Jap procura a vida toda pela Grande Beleza, sem encontrá-la, incapaz de ver a arte que se encontra ao seu redor, arte essa, aliás, que se mostra sublime ou decadente, mas está sempre presente.